O Dia Mundial da Liberdade de Imprensa comemora-se, isto é como quem diz, a 3 de Maio. Em Angola não há Dia Mundial que nos valha. E não há porque aos jornalistas (pensamos, queremos ainda pensar, que são eles que fazem a informação) restam duas opções: serem domados e manter o emprego, ou o inverso.
É claro que, no Dia Mundial da Liberdade de Imprensa (repugna-nos comemorar uma coisa que não existe), veremos toda a espécie de gentalha (desde os que trocam jornalistas por fazedores de textos aos políticos que lhes dão cobertura) dizer que são a favor do direito universal à liberdade de expressão.
Se calhar, com a hipocrisia típica e atávica que caracteriza os donos da verdade em Angola, até veremos alguns dos carrascos a recordar que os jornalistas têm sido assassinados, mutilados, detidos, despedidos e por aí fora por exercerem, em consciência, a liberdade de expressão à qual, em teoria, têm direito.
Aliás, estamos mais uma vez à espera de ver muitos dos malandros do regime que amordaçam os jornalistas aparecerem na ribalta com a bandeira da liberdade de expressão.
E se até agora o principal barómetro da liberdade de Imprensa era o número de jornalistas mortos no cumprimento do dever, hoje junta-se-lhe uma outra variante para a qual Angola dá um notório e inédito contributo: os jornalistas mercadoria, tipo Paulo Catarro.
E até veremos alguns dos algozes da liberdade de expressão (desde os donos dos jornalistas aos donos dos donos dos jornalistas) citar o artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos: “Toda pessoa tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras”.
Há alguns anos, o então secretário-geral da ONU defendeu uma tese que se tornou suicida no caso angolano. Kofi Annan disse que os jornalistas “deveriam ser agentes da mudança”.
Eles tentaram, o que aliás sempre fizerem, mudar a sociedade para melhor. Acontece que o seu conceito de sociedade melhor não é igual ao dos donos do reino. E a resposta não se faz esperar: Jornalista bom é jornalista no desempregado ou amputado da coluna vertebral e, por isso, tapete do Poder.
Angola é o país africano de língua portuguesa com pior classificação no índice de liberdade de imprensa da Freedom House, enquanto Cabo Verde é líder na África Subsariana, seguido de São Tomé e Príncipe.
O relatório “Liberdade de Imprensa 2017”, daquela organização com sede em Washington, nos EUA, agora divulgado, mostra que entre os 50 países e territórios investigados no continente, Angola ficou na 37ª posição, com 73 pontos numa escala de 0 (melhor) a 100 (pior), e no grupo dos países não-livres em matéria de liberdade de expressão e de imprensa. A nível mundial, Angola ficou na 159ª posição, num universo de 199 países e territórios analisados.
Por seu turno, Moçambique e Guiné-Bissau estão no grupo dos países parcialmente livres. O país do Índico ocupa a 13ª posição no continente e a 96ª a nível mundial, com 48 pontos na escala de 0 (melhor) a 100 (pior). A Guiné-Bissau surge mais abaixo no índice, no lugar 28 em África e 128 a nível global, com uma pontuação de 59.
Cabo Verde e São Tomé e Príncipe surgem nos dois primeiros lugares do índice de África, respectivamente, e ambos integram o grupo de países livres, tanto a nível da liberdade de expressão como de imprensa. Com 27 pontos na mesma escala, Cabo Verde ocupa a 48ª posição a nível mundial. São Tomé e Príncipe, que é segundo em África, situa-se no 53º lugar a nível global, e com 28 pontos.
A seguir aos dois arquipélagos lusófonos, nos primeiros cinco lugares do continente africano surgem as ilhas Maurícias, Namíbia e Gana. No fim da lista, estão Gâmbia, Guiné-Equatorial e Eritreia.
A Freedom House revela que nos 50 países e territórios da África Subsariana, num total de mil milhão de pessoas, apenas seis por cento vivem em países considerados livres, tanto quanto à liberdade de expressão como de imprensa.
Mais de metade, 54 por cento, vive em países parcialmente livres e 40 por cento em Estados ou territórios não-livres.Os investigadores exemplificam que em cada 100 africanos ao sul do Sahara, apenas um desfruta da liberdade de imprensa.
Com o título “Liberdade de imprensa sofre com líderes que se agarram ao poder”, o relatório da Freedom House considera que a maioria dos países da região registou um declínio da liberdade de imprensa em 2017, devido à agitação política, supressão ou adiamento de eleições e uma maior repressão por parte dos líderes políticos.
No seu relatório referente ao ano de 2016 no mundo, a Freedom House revela que a liberdade de imprensa caiu globalmente para o seu pior nível nos últimos 13 anos devido a ameaças sem precedentes contra jornalistas e meios de comunicação nas principais democracias, aumento de repressões por Estados autoritários e o crescimento da influência da Rússia e da China para além das suas fronteira.
Em termos gerais, “somente 13 por cento da população mundial goza de uma imprensa livre, ou seja de um ambiente em que a imprensa faz uma forte cobertura dos factos, a segurança é garantida, a influência do Estado no sector é mínima e os meios de comunicação não estão sujeitos a onerosas pressões jurídicas e económicas”.
Ainda de acordo com o relatório daquela organização, 42 por cento da população mundial tem uma imprensa parcialmente livre, enquanto 45 por cento vive em países onde a imprensa não é livre.
Folha 8 com VoA